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domingo, maio 01, 2011

Nutrição e promoção da saúde: perspectivas atuais


Introdução

Inicialmente podemos dizer que os primeiros
autores que fizeram referência ao conceito de
promoção da saúde foram Winslow 1 e Sigerist 2.
Ambos relacionaram o termo promoção da saúde
às condições de vida das populações. Mais
adiante Leavell & Clark 3 se apropriaram do conceito
ao formularem o modelo da história natural
da doença. Segundo os autores, a medicina
preventiva compreenderia três níveis de prevenção
e a promoção da saúde estaria incluída no
nível primário, relacionada à saúde e ao bemestar
dos indivíduos. Na realidade, o discurso da
medicina social no século XIX também manteve
aproximação com a promoção da saúde, ao
correlacionar saúde e condições de vida, através
das obras de autores como Villermé, na França
e Chadwick, na Inglaterra 4,5. Nesse sentido,
o termo promoção da saúde não é recente. No
entanto, somente nos últimos vinte anos é que a
promoção da saúde reaparece enquanto estratégia
promissora para o campo da Saúde Pública.
A valorização do conceito de promoção da saúde
na atualidade surge como resposta à crescente
medicalização, à baixa eficácia dos serviços de
saúde e aos altos custos do setor.
Nessa direção, o movimento de promoção
da saúde emerge de forma mais vigorosa, a partir
da década de 70 nos países desenvolvidos
– Canadá, Estados Unidos e Europa Ocidental.
É particularmente no Canadá que se observa a
retomada do conceito de promoção da saúde,
com a divulgação no ano de 1974, do Informe
Lalonde (A New Perspective on the Health of Canadians).
Esse documento colocou a promoção
da saúde no patamar do planejamento estratégico.
Tal proposta visava, sobretudo, a enfrentar
os altos custos com a assistência médica no país.
O Informe Lalonde obteve significativo impacto,
propiciando o desdobramento do recente movimento
de promoção da saúde em todo o mundo.
Mais adiante, em 1978, a Organização Mundial
da Saúde (OMS) realizou em Alma-Ata, a I Conferência
Internacional sobre Cuidados Primários
de Saúde. Esse evento repercutiu de forma expressiva
os sistemas de saúde em todo o mundo,
estabelecendo a meta Saúde para Todos no Ano
2000. Nessa conferência reafirmou-se enfaticamente
um conceito amplo de saúde. Saúde como
o estado de completo bem-estar físico, mental e
social, e não apenas como ausência de doença.
Essa reconceituação de saúde foi fundamental
nesse processo porque serviu de alicerce para o
atual movimento de promoção da saúde.
Posteriormente, o Ministério da Saúde do Canadá
e a OMS passaram a estruturar conceitos e
práticas sobre promoção da saúde, favorecendo
a realização da I Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde realizada em Ottawa, no Canadá,
no ano de 1986. Desse encontro resultou a
Carta de Ottawa, considerada marco referencial
da promoção da saúde 6. A conferência reuniu
participantes de todo o mundo e teve por intuito
compartilhar experiências no setor. Na Carta de
Ottawa foram definidas cinco áreas prioritárias
de ação em promoção da saúde: políticas públicas
saudáveis, criação de ambientes saudáveis,
reforço à ação comunitária, desenvolvimento de
habilidades pessoais e reorientação dos serviços
de saúde. Ainda nessa Carta, são descritos
os pré-requisitos para a saúde: paz, educação,
moradia, alimentação, renda, ecossistema saudável,
justiça social e eqüidade. A promoção da
saúde incorpora, portanto, uma noção ampliada
de saúde e passa a se aproximar da idéia de qualidade
de vida. Nessa abordagem, a saúde seria
resultado de um amplo espectro associado com
a qualidade de vida, compreendendo um conjunto
de valores: justiça social, educação, renda,
habitação, alimentação, nutrição, trabalho etc.
Qualidade de vida por sua vez seria uma noção
relacionada ao grau de satisfação dos indivíduos
com o seu meio familiar, social e ambiental. Para
Minayo et al. 7 (p. 8) “o termo abrange muitos significados,
que refletem conhecimentos, experiências
e valores de indivíduos e coletividades que a
ele se reportam em variadas épocas, espaços e histórias
diferentes, sendo, portanto uma construção
social com a marca da relatividade cultural”.
Mais adiante realizaram-se outras conferências
internacionais, que propiciaram aprofundar as
discussões em torno do tema da promoção da
saúde.

Atualmente a promoção da saúde se apresenta
como uma proposta inovadora para o setor,
pois favorece a superação de impasses importantes
no campo da Saúde Pública. Dentre eles, os
desafios relacionados ao modelo biomédico dominante,
reducionista, fragmentado, que não responde
às demandas atuais de saúde. A promoção
da saúde incorpora ainda, um conceito ampliado
de saúde, que tem como objetivo propiciar um
nível ótimo de vida e saúde às populações. Buss 4
(p. 165) sintetizou de forma apropriada a proposta
de promoção da saúde ao afirmar: “A promoção
da saúde, como vem sendo entendida nos últimos
20-25 anos, representa uma estratégia promissora
para enfrentar os múltiplos problemas de saúde
que afetam as populações humanas e seus entornos
neste final de século (...) propõe a articulação
de saberes técnicos e populares, e a mobilização de
recursos institucionais e comunitários, públicos e
privados, para seu enfrentamento e solução”.

A promoção da saúde no Brasil

No Brasil, o movimento de promoção da saúde
assume destaque no ano de 1986 com a realização
da VIII Conferência Nacional de Saúde
(CNS/MS). Em seu relatório final frisou-se: “O
direito à saúde significa a garantia, pelo Estado,
de condições dignas de vida e de acesso universal
e igualitário às ações e serviços de promoção,
proteção e recuperação da saúde, em todos os níveis,
a todos os habitantes do território nacional,
levando ao desenvolvimento pleno do ser humano
em sua individualidade” 8 (p. 382). Em 1988,
a Constituição Federal brasileira reforça o tema
da promoção quando declara no seu art. 196: “A
saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas
que visem à redução do risco de doenças e outros
agravos e ao acesso universal e igualitário às ações
e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
Na década de 90 o Sistema Único de Saúde
(SUS), por meio da Lei nº. 8080/90, incorpora
a noção ampla de saúde dentro do contexto da
promoção 9. Seguem-se em 1992 os eventos Cúpula
da Terra e Rio 90: Agenda 21, em que se discutiu
o tema dos ambientes saudáveis. Em 1999,
o Ministério da Saúde no Brasil realiza o I Fórum
Nacional sobre Promoção da Saúde, em Brasília.
O objetivo do fórum consistiu na divulgação das
experiências e na criação de espaços para debate
em promoção da saúde no país. Posteriormente,
a realização da X Conferência Nacional de Saúde
promoveu o debate acerca dos modelos de atenção
voltados para a qualidade de vida.
Atualmente, o Ministério da Saúde no Brasil
tem subsidiado ações de educação em saúde,
vigilância e reorganização da rede de assistência
básica, com a implementação do Programa
Saúde da Família (PSF), Programa Agentes Comunitários
de Saúde (PACS), Bolsa Família e Renda
Mínima, Aleitamento Materno, Programa de
Educação e Saúde através do exercício físico e do
esporte, Programa de Humanização no Pré-Natal
e Nascimento, entre outros 10. Essas ações têm
favorecido a inclusão do tema da promoção na
agenda política de saúde do país 10. Recentemente
realizou-se no Rio de Janeiro, em maio de 2005,
o I Seminário Brasileiro de Efetividade da Promoção
da Saúde, evento promovido pela Escola
Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação
Oswaldo Cruz, cujo propósito foi analisar
o impacto das ações sobre promoção da saúde
no Brasil. Desse encontro resultou as propostas
de expansão das experiências em promoção no
país, a construção de uma rede de promoção da
saúde e a criação de um programa de evidência
de efetividade em promoção da saúde no Brasil,
reunindo a Oficina Regional Latino-Americana
da União Internacional de Promoção da Saúde e
Educação para a Saúde (UIPES/ORLA), Associação
Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva
(ABRASCO) e outras instituições nacionais 10.
Torna-se apropriado ressaltar, que o discurso
da promoção da saúde se insere no contexto das
limitações do modelo biomédico, que estrutura
toda a organização do complexo médico-industrial.
As críticas a esse modelo se dirigem à hegemonia
do enfoque curativo, reducionista, hospitalocêntrico
e de alto custo. Tal proposta não
equaciona os agravos decorrentes do perfil de
morbimortalidade das sociedades contemporâneas
4. Nesse sentido, a promoção da saúde favorece
a superação desses impasses, porque amplia
o conceito de saúde, incorpora novos princípios
às práticas médicas, diferentes campos de conhecimento
e, ainda, propõe estratégias organizacionais
para os serviços de saúde. Dessa forma,
a promoção da saúde visa a enfrentar os limites
do modelo biomédico hegemônico e dos modelos
de intervenção em saúde pública, apontando
novos direcionamentos para o setor. Dentro
desse contexto, acreditamos que a promoção da
saúde situa-se em processo de construção teórica
e prática. Aponta para o redirecionamento das
políticas e programas de saúde no país. Assim
sendo, o debate sobre promoção da saúde nos
remete a mudanças nas ações tradicionais no
campo da saúde pública e, conseqüentemente,
elas incluem as práticas nutricionais. Este trabalho
tem por objetivo contribuir para o debate em
torno da promoção da saúde, a partir da aproximação
do tema com o campo da alimentação e
nutrição.

O campo da alimentação e nutrição no
debate da promoção da saúde

A alimentação e nutrição constituem direitos
humanos fundamentais consignados na Declaração
Universal dos Direitos Humanos e são requisitos
básicos para a promoção e a proteção
da saúde, possibilitando a afirmação plena do
potencial de crescimento e desenvolvimento
humano com qualidade de vida e cidadania. O
direito à alimentação é um direito do cidadão,
portanto, dever do Estado e responsabilidade da
sociedade. Nesse sentido, a busca em garantir o
direito à alimentação de qualidade para todos os
indivíduos, passa pela construção de um novo
paradigma de sociedade, que tenha como eixo
central a qualidade de vida do ser humano 11.
Nessa direção, a Declaração de Adelaide 12,
documento produzido na II Conferência Internacional
de Promoção da Saúde realizada em 1988
na Austrália, destacou como uma das áreas prioritárias
para a promoção da saúde: a alimentação
e nutrição. A eliminação da fome, da má nutrição
e dos agravos relacionados ao excesso de peso,
foi considerada meta essencial para a melhoria
da qualidade de vida das coletividades. De acordo
com essa declaração, as ações no setor de alimentação
devem se estruturar no contexto da
segurança alimentar e nutricional, para a garantia
do acesso universal à ração de qualidade em
quantidade suficiente, com respeito aos aspectos
sócio-culturais das populações. Para tal, são propostas
medidas de integração entre os setores de
produção, distribuição e acesso aos alimentos,
a fim de assegurar o direito eqüitativo e justo à
alimentação 11. Nesse mesmo ano, a Constituição
Federal brasileira reconhece a alimentação como
um direito humano universal. Mas adiante,
no ano de 1999, o Ministério da Saúde no Brasil
elabora a Política Nacional de Alimentação e Nutrição,
reforçando a questão da garantia à ração
alimentar digna 13.

No Brasil, inúmeros são os desafios encontrados
para que a população alcance um nível ótimo
de nutrição. A complexidade dos problemas
alimentares, advindos da transição nutricional
em curso no país, tem imposto reformulações
urgentes ao setor, a fim de responder as novas demandas
alimentares. A transição nutricional pode
ser conceituada como um fenômeno no qual
ocorrem mudanças nos padrões de distribuição
dos problemas alimentares de uma população.
Em geral, refere-se à passagem da desnutrição
para a obesidade 14. No Brasil, a transição nutricional
assumiu um perfil singular 14,15. Assim,
sem equacionar satisfatoriamente os problemas
alimentares relacionados à carência absoluta de
alimentos, o país convive com perfis nutricionais
distintos, por vezes, sobrepostos. Nota-se
a evolução da desnutrição, a permanência das
anemias carenciais e o incremento da obesidade
e dos agravos relacionados a ela. Tal perfil tem
exigido dos profissionais nutricionistas uma reflexão
mais aprofundada de seu papel enquanto
agente ativo nesse processo. Sem dúvida, a
superação dos problemas alimentares no país
envolve aspectos intricados. Nesse contexto, a
proposta de promoção da saúde sugere um caminho
promissor para o campo da alimentação
e nutrição. Fundamentalmente por se tratar de
uma estratégia que articula diferentes setores e
atores sociais, onde perpassam questões como:
modelo de saúde sob o enfoque da integralidade;
articulação de saberes técnicos e populares;
capacitação dos indivíduos; parcerias nas ações;
intersetorialidade de órgãos públicos e privados;
reforço à ação comunitária; educação popular;
cidadania; ética pública; entre outros. Qual seria
então o papel da nutrição frente à proposta de
promoção da saúde? O que esse debate poderia
apontar de novo para as práticas nutricionais?
Quais as implicações desse modelo para o profissional
nutricionista?

Nutrição para a promoção da saúde

Tomando como referência os campos de ação
em promoção da saúde supracitados, a proposta
deste trabalho é refletir sobre a atuação do profissional
nutricionista no contexto da promoção
da saúde. Nessa direção, no que compreende a
adoção do modelo de atenção sob o enfoque da
integralidade, o desafio imposto à categoria dos
nutricionistas remete a mudanças estruturais,
que têm início na própria formação acadêmica
do profissional. Analisando os currículos dos
cursos de nutrição, notamos que eles se apresentam
moldados sob a vertente biológica da atenção
clínico-assistencial estruturada no modelo
biomédico dominante. E, em contrapartida, na
deficiente abordagem prestada às questões políticas,
sócio-econômicas e culturais necessárias,
não somente para a construção de uma análise
crítica a respeito da conjuntura alimentar dos
grupos populacionais, mas para as medidas de
atenção em saúde. A repercussão desse fato está
na dificuldade de articular os conhecimentos
biológicos da nutrição com sua dimensão social,
prejudicando a percepção da totalidade do fenômeno
sob estudo 16,17. Na prática, essas implicações
se apresentam sob a difícil tarefa encontrada
pelo nutricionista em realizar uma análise mais
aprofundada acerca da dinâmica dos problemas
alimentares 17. Conseqüentemente, esse fato gera
entraves na implementação de medidas de intervenção
mais consistentes. Vale ressaltar que
essa tem sido uma tendência das profissões da
área da saúde. A formação tecnicista se apresenta
como um dos principais empecilhos para a
prática da integralidade. De tal forma que, atualmente,
emerge o movimento para a reforma na
graduação. Nesse sentido, há urgência na definição
de uma política de Estado para a formação
de profissionais de saúde, com base no modelo
da integralidade 18,19,20. Ainda sob esse aspecto,
não tem sido incomum verificar a insatisfação
dos profissionais nutricionistas com a sua prática,
deflagrada através de sentimentos de frustração
e impotência frente ao seu trabalho cotidiano,
como têm demonstrado alguns estudos
nacionais com esta categoria 21,22,23. A inclusão
do campo da alimentação e nutrição no debate
da promoção da saúde parece apontar para avanços
importantes, abrindo novos horizontes para
a atuação desses profissionais, os nutricionistas
sociais. Se por um lado temos a possibilidade de
repensar nossa prática enquanto profissionais de
saúde e nossa atuação no campo da saúde pública,
de outro temos importantes percalços a serem
superados. O desafio, portanto, está em superar
práticas convencionais e fragmentadas, decorrentes
desse modelo de formação profissional.

A ação que envolve o segundo campo de atuação
em promoção da saúde refere-se à articulação
de saberes técnicos e populares. Essa ação se
aproxima fundamentalmente da discussão anterior,
pois implica transcender modelos tradicionais
de atuação em nutrição. Ações de promoção
da saúde impõem a criação de espaços democráticos
e participativos, a fim de estabelecer uma
aproximação com a realidade dos indivíduos e
das populações. O objetivo é tentar responder
melhor às demandas de saúde e nutrição. Dessa
forma, abordagens persuasivas e ações verticais
devem ser substituídas por estratégias mais
amplas provenientes da relação profissional-paciente,
a partir do somatório de saberes técnicos
e populares. Nesse aspecto, torna-se imprescindível
superar a relação hierárquica entre o profissional
e o usuário.

No âmbito das ações direcionadas à capacitação
dos indivíduos, o propósito será garantir condições
para que a população possa exercer sua
autonomia decisória, optando por escolhas alimentares
mais saudáveis. Nesse aspecto, a educação
nutricional assume um papel fundamental
para o exercício e fortalecimento da cidadania
alimentar. A prática do nutricionista assume o
desafio de promover uma educação nutricional
eficaz, com ações que promovam mudanças nos
hábitos alimentares dos indivíduos e de suas famílias.
Sob esse aspecto é interessante destacar
que na primeira publicação da OMS, que tratou
especificamente da questão da educação nutricional,
já se fazia referência sobre a importância
do ensino de bons hábitos alimentares para as
populações 24. Assim, outro ponto fundamental a
ser destacado quando se propõe a articulação do
campo da alimentação e nutrição no contexto de
promoção da saúde é justamente o tema da educação
nutricional. Destacamos que a educação
nutricional a qual nos referimos, diz respeito a
um processo de aprendizagem e não de adestramento.
Educar no sentido de um processo amplo
de desenvolvimento da pessoa, na busca de sua
integração e harmonização, nos diversos níveis
do físico, do emocional e do intelectual 25. Deve
envolver metodologia de ensino-aprendizagem
para o desenvolvimento de habilidades individuais,
que permitam enfrentar as questões relacionadas
à alimentação e nutrição.

A análise acerca da educação nutricional no
Brasil 26 revela desafios importantes à categoria
profissional dos nutricionistas. Embora seja disciplina
obrigatória dos currículos de nutrição e
conteúdo das práticas desenvolvidas por esses
profissionais, a fragilidade de integrá-la com disciplinas
de cunho social tal como nos referimos
anteriormente, tende a comprometer a qualidade
e a eficácia dos programas de educação
nutricional. Isso porque a contextualização dos
problemas alimentares, a partir da agregação de
disciplinas provenientes do campo das ciências
humanas e sociais, mostra-se essencial nesse
processo 17. Observa-se que o modelo tradicional
da educação nutricional normalmente não
propõe métodos de ensino problematizadores e
construtivistas. Em geral, o método tradicional
de educação nutricional se concentra nos efeitos
biológicos dos nutrientes no organismo, na
orientação alimentar, e ainda, na preservação
das propriedades nutritivas dos alimentos envolvendo
as técnicas de preparo e armazenamento.
Tais ações podem ser consideradas benéficas já
que, em algumas circunstâncias, verifica-se que
os indivíduos apresentam desconhecimento
sobre a questão alimentar. Entretanto, é preciso
reconhecer que o Brasil é um país extenso, que
apresenta contrastes e desigualdades sociais que
acabam por comprometer o acesso da população
ao direito universal à alimentação. A desigualdade
no acesso à ração alimentar é uma realidade
vivenciada por parcelas significativas da população
brasileira. Ou seja, o país apresenta uma
enorme fragilidade no que se refere à questão da
segurança alimentar e nutricional 27. Assim, nas
sociedades onde existem agravos relacionados
à má nutrição tal como o Brasil, verifica-se também
desigualdades no acesso e na produção dos
alimentos 27. Nesse aspecto, medidas de democratização
dos recursos produtivos por meio da
inclusão dos indivíduos e das comunidades nesse
processo são fundamentais. As ações de incentivo
à agricultura familiar, a hortas comunitárias,
a cooperativas agrícolas, se apresentam como alternativas
viáveis. Devemos destacar que as desigualdades
no acesso à ração alimentar digna, se
refere a uma produção social e econômica, que
deve ser combatida pelos nutricionistas sociais.
Torna-se necessário ressaltar ainda, a importância
do diagnóstico consistente por parte dos nutricionistas,
a fim de reconhecer as reais condições
de nutrição dos indivíduos e comunidades
assistidas. A partir dele será possível propor medidas
educativas de maior resolutividade. Dessa
maneira, se os problemas alimentares decorrem
da dificuldade de acesso aos alimentos, pouco
impacto terão as técnicas de aconselhamento e
orientação alimentar.

Ações que se propõem ao reforço à ação comunitária
devem sobrepor atividades de educação
nutricional de aconselhamento. Demandam
a criação de espaços públicos, que possam desenvolver
o pensamento crítico para a identificação
de problemas e a elaboração de estratégias
para sua superação. Implica a valorização de espaços
para o debate e o estabelecimento de parcerias
entre profissional-usuário-comunidade.
No âmbito coletivo, ao educador caberia assumir
seu papel de agente político. A participação na
formulação das políticas, programas e ações em
alimentação e nutrição junto ao poder público,
assim como, sua articulação com as organizações
não-governamentais, o setor privado e a
sociedade civil são fundamentais. A inserção nos
espaços educativos, tais como creches, escolas
e nos meios de comunicação de massa também
devem ser fomentadas. É imprescindível ainda,
que o educador promova, ou esteja engajado, em
debates, encontros, seminários, sejam eles locais
ou nacionais, para o fortalecimento das ações de
educação nutricional.

A educação popular, por sua vez, compreende
todos os aspectos já discutidos. Deve envolver
atividades direcionadas a: mudança comportamental,
informações sobre políticas públicas vigentes,
assim como o incentivo ao exercício permanente
dos diretos e deveres, especialmente os
relacionados à alimentação. Importante enfocar
nessas ações, informações nutricionais e educação
com enfoque na higiene e saúde. Por fim, o
último campo de ação em promoção da saúde remonta
à questão da intersetorialidade das ações e
será discutido a seguir.

O desafio da intersetorialidade
O debate em torno da promoção da saúde parte
do pressuposto de que saúde e qualidade de vida
não dependem do oferecimento isolado de um
dado serviço, mas sim, da oferta de um conjunto
de condições de vida e de trabalho 28. Trata-se,
portanto, de uma proposta que implica formação
de alianças, estabelecimento de parcerias e intersetorialidade
nas ações. A questão da intersetorialidade
apresenta-se como principal estratégia
para implementação da proposta de promoção
da saúde. Consiste no reconhecimento de que o
setor saúde isoladamente não consegue responder
às demandas de saúde da população, criando
com isso a necessidade de articular as ações de
saúde com os demais setores da sociedade. Buss
& Ramos 29, ao fazerem referência ao tema da intersetorialidade,
alertam que, para sua efetivação,
há necessidade de superar e romper as barreiras
comunicacionais. Para os autores são elas que
impedem o diálogo entre os diferentes setores.
Refletindo especificamente sobre a prática
do nutricionista, a questão intersetorial pode
nortear a atuação destes profissionais nos diversos
cenários, que ultrapassam o âmbito das unidades
de saúde. Isso porque, tradicionalmente, a
prática do nutricionista em unidades de atenção
primária de saúde se configura pela atuação do
profissional no consultório, por meio do atendimento
ambulatorial, integrado ou não, ao trabalho
em equipe. Cabe ao nutricionista promover
intervenção alimentar através do atendimento
individualizado ou em grupo, e realizar atividade
preventiva de educação nutricional. São
ainda atribuições do profissional nutricionista
nas unidades locais: a vigilância nutricional e a
elaboração de estatísticas sobre as atividades desempenhadas
nas unidades. Assim, o cotidiano
de práticas desempenhadas por esses profissionais
nas unidades básicas de saúde apresenta-se
circunscrito ao consultório, ou no máximo, em
atividades dentro da própria unidade. A partir
da intersetorialidade é possível inserir a nutrição
em outros ambientes sociais, tais como nas
escolas públicas e privadas; na comunidade por
intermédio dos agentes comunitários de saúde,
das associações de moradores e do próprio PSF
proposto pelo Ministério da Saúde; no ambiente
de trabalho formal; nas ações de vigilância sanitária;
nos órgãos de comunicação em geral; nas
organizações não-governamentais (ONGs); em
zonas agrícolas; enfim, inúmeros são os espaços
nos quais a nutrição pode estar articulada. Fundamentalmente,
essa inserção coloca a temática
da nutrição no cerne das discussões nos diversos
espaços sociais, fortalecendo dessa maneira, esse
campo de práticas.

Importante destacar que a estratégia da intersetorialidade
é especialmente importante para
a área de segurança alimentar e nutricional.
Reconhecidamente a questão alimentar é complexa
e impõe a formação de alianças por envolver
diferentes esferas das políticas públicas, tais
como a produção, comercialização, distribuição
e consumo de alimentos, controle de qualidade,
estímulo à educação nutricional, dentre outras
ações 30. A intersetorialidade se apresenta, assim,
como uma estratégia prioritária na construção
de espaços legítimos para o diálogo entre os diferentes
setores envolvidos na dinâmica alimentar,
visando a assegurar o acesso à alimentação
digna.

O estabelecimento de parcerias impõe desprendimento,
ousadia, envolvimento e criatividade
para os profissionais nutricionistas porque
rompe com as formas convencionais de atuação
da categoria. Nesse sentido, parcerias setoriais, o
somatório de saberes técnicos e populares, a superação
do modelo biomédico dominante com
a incorporação da visão integral dos indivíduos,
assim como, a habilidade técnica desses profissionais
(com ênfase na educação nutricional),
nos parece ser o caminho para incorporar a nutrição
dentro da proposta de promoção da saúde.
Sabemos não se tratar de tarefa fácil, porém ela
nos é requisitada e, portanto, necessária. Como
mencionamos anteriormente, a transição nutricional
em curso no país, justifica a mobilização
dos nutricionistas sociais nas ações de promoção
da saúde.

Conclusão

Por fim, destacamos que os desafios impostos
para o campo da nutrição no contexto da promoção
da saúde são inúmeros. No entanto,
tais desafios apontam para a possibilidade de
compatibilizar diferentes olhares e perspectivas
teórico-metodológicas na direção do diálogo
interdisciplinar. Repensando seu lugar como
profissional da área da saúde e reintegrando as
práticas alimentares ao conjunto de experiências,
saberes e intervenções voltadas ao atendimento
das necessidades sociais dos indivíduos e
grupos sociais, o nutricionista pode avançar na
construção de uma proposta de atuação capaz
de contribuir para a redução das iniqüidades em
saúde e a garantia da qualidade de vida. Nesse
esforço, portanto, a discussão da efetividade das
ações, o aprendizado com as experiências em
curso, a escolha de novas ferramentas metodológicas
devem penetrar na formação e no exercício
profissional, tendo por intuito romper a
fragmentação tecnicista tradicional e promover
a integralidade, a intersetorialidade, a eqüidade
e a participação social. A mobilização em torno
de uma nova prática para o nutricionista estabelece,
assim, elos fortes com o debate acerca
da formulação e implementação de políticas e
ações de promoção da saúde.

Resumo

A promoção da saúde tem ao longo dos últimos anos
se apresentado como uma estratégia promissora para
o campo da Saúde Pública. Este estudo propõe articular
o tema da nutrição no debate contemporâneo da
promoção da saúde, analisando o papel dos nutricionistas
neste processo. Frente ao reconhecimento da
complexidade do quadro alimentar brasileiro advindo
da transição nutricional em curso no país, a proposta
de promoção da saúde aponta perspectivas, mas também
desafios ao campo da alimentação e nutrição. Em
linhas gerais, novas exigências relacionadas à formação
acadêmica e ao modelo de atenção tendem a fortalecer
a busca de parcerias, inovação das práticas alimentares
à educação nutricional voltada à construção
da cidadania alimentar.
Promoção da Saúde; Educação Alimentar e Nutricional;
Transição Nutricional; Nutrição
Colaboradores
V. A. Ferreira foi responsável pela elaboração, redação
e revisão do artigo. R. Magalhães participou da elaboração
e revisão

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